Uma notícia triste abalou os corações de quem vive e respira a arte em Mogi das Cruzes. Clarice Jorge, conhecida carinhosamente como a dama do teatro mogiano, nos deixou aos 88 anos de idade. Lutando há algum tempo contra o Alzheimer, ela também enfrentava um câncer no pâncreas, que foi diagnosticado recentemente.
Clarice faleceu em casa, cercada por lembranças de uma vida inteira dedicada ao palco e à cultura. Ela deixa sua companheira, com quem dividiu momentos de cumplicidade e afeto, além de seis sobrinhos que sempre estiveram por perto. Uma perda que vai muito além da família — é um pedaço da história cultural da cidade que parte com ela.
O velório aconteceu no salão do Cristo Redentor, um lugar que já testemunhou despedidas importantes, mas poucas com o peso simbólico dessa. O enterro foi marcado para às 15h da quinta-feira, dia 3, e reuniu amigos, artistas, alunos e admiradores. Muita gente foi prestar essa última homenagem — não apenas pelo que ela representava nos palcos, mas pela mulher forte e carismática que foi fora deles também.

Clarice não era apenas uma atriz. Era diretora, mentora, formadora de gerações. À frente do Teatro Experimental Mogiano, o famoso TEM, ela ajudou a construir uma base sólida pras artes cênicas locais. Quem passou por lá nas últimas décadas, com certeza tem uma história com ela. E não foram poucas as montagens que ela assinou, sempre com aquele olhar exigente, mas cheio de paixão pelo que fazia.
Não dá pra falar de teatro em Mogi sem citar o nome dela. Clarice era dessas figuras que, mesmo quando caladas, tinham presença. Voz firme, postura de palco, riso fácil. Dizem que ela sabia “ler uma cena” como poucos. E mais do que isso, ela sabia ensinar isso pros outros, o que é raro.
Quem conviveu com Clarice fala de uma mulher de personalidade forte, às vezes até teimosa, mas sempre justa e generosa. Ela tinha um jeito meio ranzinza de mostrar carinho, mas era afetuosa nas entrelinhas. Gostava de café passado na hora, adorava reler peças clássicas (principalmente Shakespeare, que ela dizia que “nunca envelhece”) e ainda lia jornal impresso todo dia, mesmo quando a memória começou a falhar.
Nos últimos anos, a doença foi tirando um pouco daquele brilho rápido do olhar. Mas até nisso Clarice foi guerreira. Continuou aparecendo em eventos culturais enquanto podia, mesmo que por pouco tempo. E nunca deixava de comentar uma peça nova, dar uma sugestão, uma crítica, uma lembrança.
A morte dela acontece num momento em que o teatro tenta se reerguer após tempos difíceis, com pandemia, cortes de verbas e tudo mais. Perder alguém como Clarice agora, parece ainda mais dolorido. Ela representava uma resistência viva, um elo entre o passado e o presente das artes mogianas.
Talvez o maior legado dela seja esse: ter mostrado pra muita gente que fazer teatro não é só subir no palco. É viver praquilo. Ensinar, aprender, recomeçar. Aplaudir os outros. Saber sair de cena na hora certa.
Clarice Jorge agora faz parte da memória afetiva de Mogi das Cruzes. E como toda boa atriz, sua última cena foi digna de aplausos de pé.